Família

Uma riquíssima fonte de continuidade entre as gerações

Em meu último artigo, falei do que é a tradição. Afirmei, sobretudo, que são demolidores da Pátria todos os que se esforçam por promover um progresso alheio e até hostil à tradição. Hoje, quero mostrar que a tradição é fruto necessário da família, de sorte que, por toda a parte em que floresça a família, ficarão impregnados de tradições os costumes públicos e privados, a cultura e a civilização.

Ainda desta vez, sirvo-me de alguns luminosos textos de Pio XII. Lembra ele, antes de tudo, alguns motivos de ordem natural pelos quais a família é uma riquíssima fonte de continuidade entre as gerações, ao longo dos séculos: “Desta grande e misteriosa coisa que é a hereditariedade – quer dizer, o passar através de uma estirpe, perpetuando-se de geração em geração, de um rico acervo de bens materiais e espirituais: a continuidade de um mesmo tipo físico e moral, conservando-se de pai para filho; a tradição que une através dos séculos os membros de uma mesma família – desta hereditariedade, dizemos, se pode sem dúvida entrever a verdadeira natureza sob o aspecto material. (…)

Não se negará certamente o fato de um substrato material à transmissão dos caracteres hereditários; para estranhar isto, precisaríamos esquecer a união íntima de nossa alma com nosso corpo, e em quão larga medida as nossas mesmas atividades mais espirituais dependem de nosso temperamento físico”.

Em seguida, o Pontífice trata dos fatores morais e sobrenaturais da tradição familiar: “Mas o que mais vale é a hereditariedade espiritual, transmitida não tanto por esses misteriosos liames da geração material, quanto pela ação permanente daquele ambiente privilegiado que constitui a família, com a lenta e profunda formação das almas, na atmosfera de um lar rico de altas tradições intelectuais, morais e sobretudo cristãs, com a mútua influência entre aqueles que moram em uma mesma casa, influência essa cujos benéficos efeitos se prolongam muito além dos anos da infância e da juventude, até o fim de uma longa vida, naquelas almas eleitas que sabem fundir em si mesmas os tesouros de uma preciosa hereditariedade com o contributo de suas próprias qualidades e experiências.

Tal é o patrimônio, mais do que todos precioso que, iluminado por firme fé, vivificado por forte e fiel prática da vida cristã em todas as suas exigências, elevará, aprimorará, enriquecerá as almas de vossos filhos” (Discurso à Nobreza e ao Patriciado Romano, “L`Osservatore Romano” de 7/8-1-1941).

Mas, dirá alguém, essa concepção, que parece supor um longo passado aristocrático, é imprópria para continentes novos como o nosso. Pio XII parece ter previsto a objeção. Diz ele: “Também nas democracias de recente data (…) foi se formando, pela própria força das coisas, uma espécie de nova nobreza ou aristocracia. É a comunidade das famílias que, por tradição, põe todas as suas energias ao serviço do Estado, de seu governo, da administração, e sobre cuja fidelidade ele pode contar a qualquer momento” (idem, “L`Osservatore Romano” de 9-1-47).

O testemunho da história

A tradição não é, então, o contrário da verdadeira democracia, vigente – pelo menos em tese – em toda a América? Ouçamos Pio XII: “Segundo o testemunho da história, onde reina uma verdadeira democracia a vida do povo está como que impregnada de sãs tradições, que é ilícito abater. Representantes destas tradições são, antes de tudo, as classes dirigentes, ou seja, os grupos de homens e de mulheres ou as associações que dão, como se costuma dizer, o tom na aldeia e na cidade, na região e no país inteiro.