Imaculada Conceição

A Revolução fomenta todo tipo de pecados e, no fundo, é dirigida pelo espírito das trevas. Maria Santíssima, sendo concebida sem pecado original, esmagou a cabeça da serpente, ou seja, do  demônio. A Imaculada Conceição, sob diversos pontos de vista, é a solenidade de Nossa Senhora da Contra-Revolução.

Na Bula “Ineffabilis Deus” de Pio IX, em que ele definiu o dogma da Imaculada Conceição, se encontra o seguinte trecho:

Beleza da afirmação magisterial da Igreja

Por isto, depois de, na humildade e no jejum, dirigirmos sem interrupção as Nossas preces particulares, e as públicas da Igreja a Deus Pai, por meio de seu Filho, a fim de que se dignas-se dirigir e sustentar a Nossa mente com a virtude do Espírito Santo; depois de implorarmos com gemidos o Espírito Consolador; por sua inspiração, em honra da santa e indivisível Trindade, para decoro e ornamento da Virgem Mãe de Deus, para exaltação da Fé católica, e para incremento da Religião cristã, com a autoridade de Nosso Senhor Jesus Cristo, dos Bem–aventurados Apóstolos Pedro e Pau-lo, e com a Nossa, declaramos, pronunciamos e definimos:

Vejam a pulcritude disso que vamos comentar daqui a pouco, mas a fórmula é linda.

A doutrina que sustenta que a Beatíssima Virgem Maria, no primeiro instante da sua Conceição, por singular graça e privilégio de Deus onipotente, em vista dos méritos de Jesus Cristo, Salvador do gênero humano, foi preservada imune de toda mancha de pecado original, essa doutrina foi revelada por Deus, e por isto deve ser crida firme e inviolavelmente por todos os fiéis.

[…]

Ninguém, portanto, se permita infringir este texto da Nossa declaração, proclamação e definição, nem contrariá-lo e contravir-lhe. E se alguém tivesse a ousadia de tentá-lo, saiba que incorre na indignação de Deus onipotente e dos Bem-aventurados Pedro e Paulo, seus Apóstolos.

Notem a verdadeira beleza da afirmação magisterial da Igreja que, ponto por ponto, está considerada aqui. É ainda o período dos grandes documentos pontifícios e dos grandes estilos de chancelaria. Analisemos esse texto.

Jejum e oração para preparar a alma

Por isto, depois de, na humildade e no jejum, dirigirmos sem interrupção as Nossas preces particulares, e as públicas da Igreja a Deus Pai, por meio de seu Filho, a fim de que se dignasse de dirigir e sustentar a Nossa mente com a virtude do Espírito Santo…

Realmente o Papa é infalível, mas é obrigado, sob pena de pecado mortal, a estudar profundamente o assunto antes de definir um dogma.

Quer dizer, ainda que o Papa não estudasse, tendo definido um dogma está definido e não erraria. Mas ele deve estudar, do contrário comete pecado mortal.

Ele precisa rogar a Deus que esse estudo seja bem feito e conte com as luzes do Espírito Santo. E não só deve pedir, mas também procurar obter isso por meio do jejum, da penitência. Então, por causa disso o Papa explica como preparou a sua alma para a definição do dogma: ele jejuou e rezou continuamente para obter as luzes.

Como ele pediu essas luzes? O Papa rezou e fez a Igreja inteira orar ao Padre Eterno, por meio de seu Filho, Jesus Cristo, porque o Mediador necessário que temos entre o Padre Eterno e nós é Nosso Senhor Jesus Cristo.

Vemos aqui mencionada a Santíssima Trindade. O Padre, o Filho e o Espírito Santo intervindo para orientar o Papa no acerto dessa definição.

…depois de implorarmos o socorro de toda a corte celeste…

Ele pediu a todos os Anjos e Santos do Céu e, sobretudo, Àquela que é a “Regina Sanctorum Omnium e Regina Angelorum”.

…e invocarmos com gemidos o Espírito Consolador, por sua inspiração, em honra da santa e indivisível Trindade…

Quer dizer, inspirado pelo Espírito Santo para dar honra a Deus.

…para decoro e orna-mento da Virgem Mãe de Deus…

Decoro quer dizer esplendor, uma beleza refulgente de dignidade da Virgem Mãe de Deus.

…para exaltação da Fé católica…

“Exaltare” quer dizer tornar alta; para que a Fé católica brilhe aos olhos do mundo inteiro e se levante aos olhos dos homens como um valor de primeira grandeza.

…e para incremento da Religião cristã…

Para aumentar o número de católicos.

Como as badaladas de um grande sino de bronze

Vejam a solenidade desta afirmação:
…com a autoridade de Nosso Senhor Jesus Cristo, dos Bem-aventurados Apóstolos Pedro e Paulo, e com a Nossa, declaramos, pronunciamos e definimos:
Quer dizer, é um apelo à autoridade de Deus, feito de modo magnífico. A autoridade de Cristo, de São Pedro, primeiro Papa, de São Paulo, que ajudou São Pedro na evangelização do Império Romano, e a autoridade pessoal dele, que é o Pedro redivivo e Cristo redivivo.

Com essa autoridade, o que ele faz? Declara, pronuncia e define. Isso soa como as badaladas de um grande sino de bronze: “Declaramos, pronunciamos e definimos”. Definimos o quê?
A doutrina que sustenta que a Beatíssima Virgem Maria, no primeiro instante da sua Conceição, por singular graça e privilégio de Deus onipotente, em vista dos méritos de Jesus Cristo, Salvador do gênero humano, foi preservada imune de toda mancha de pecado original…

Nossa Senhora não teve mancha do pecado original por uma graça singular, em vista dos méritos de Cristo e a partir do primeiro instante do seu ser.

…essa doutrina foi revelada por Deus e por isso deve ser crida firme e inviolavelmente por todos os fiéis.

Ela está fundamentada na Bíblia, na Revelação, na Tradição, portanto deve ser crida.

Agora vem o anátema. Depois da definição do dogma, o castigo para quem se levante contra ele.

Ninguém, portanto, se permita infringir este texto de Nossa declaração, proclamação e definição, nem contrariá-lo…

Quer dizer, depois de ter alçado o estandarte, ele o protege com suas maldições e com a energia dos meios de combate espirituais.

E se alguém tivesse a ousadia de tentá-lo, saiba que incorre na indignação de Deus onipotente, dos Bem–aventurados Pedro e Paulo e de seus Apóstolos.

Ou seja, é uma verdadeira maldição. Notem a majestade e a dignidade que isso tem. Pois bem, é uma majestade e uma dignidade invisível, mas é uma coisa verdadeiramente estupenda, quando se considera a Imaculada Conceição de Nossa Senhora.

Alegria, glória e resplendor em todo o universo

Tomem em consideração que Maria Santíssima foi preservada depois de milênios em que só nasciam homens concebidos no pecado original; pois tinha havido um fato cuja consequência natural e normal era que todos os homens nascessem com o pecado original. E esse fato era o pecado de Adão. Portanto, todos os homens carregando a tara do pecado original.

Essa espécie de dissociação entre a inteligência e a vontade, de um lado, e os sentidos, de outro lado, pela qual, a todo momento, os sentidos estão em revolta contra a inteligência e a vontade, estas capitulam e os homens ficam expostos então a cair em pecado, e de fato pecam incontáveis vezes.

Isso veio se repetindo durante milênios, mas em determinado momento cessa a lei da maldição; os Anjos assistem atônitos a um fato que era completamente sem precedentes, e que depois não houve outro igual.

Deus quebranta a lei da maldição, expulsa a maldição e, pela primeira vez, cria uma criatura inteiramente concebida sem pecado original.

Essa criatura — que é Nossa Senhora — está completamente fora dessa lei e resplandece, com todo o brilho, com todo o fogo de uma criatura perfeita, que era como Adão e Eva foram criados, sem nenhuma espécie de mancha de pecado original.

Há em todo o universo uma espécie de alegria, de glória e de resplendor especial, e que se torna ainda mais acentuado pelo fato de que a Santíssima Virgem é criada sem pecado original, é a obra-prima de Criação.

Mais alta do que Ela, só a humanidade santíssima de Nosso Senhor Jesus Cristo. Mas Nosso Senhor Jesus Cristo já não é mera criatura. Na sua humanidade é uma criatura, mas na sua Pessoa, que é uma só, Ele não é uma mera criatura.

Então, se compreende a convergência dos dois fatos.

Aquela que calcou aos pés a cabeça do dragão

A Bíblia nos conta que, depois de ter feito a obra da Criação, Deus descansou encantado com o que Ele tinha realizado. Mas descansou com projeto de criar uma criatura superior, mais maravilhosa do que tudo isso: uma mulher que fosse Mãe do Verbo de Deus Encarnado. Então, essa obra-prima da Criação se faz nesse momento. E os Anjos, que compreendem toda a harmonia de tudo quanto Deus fez, o reflexo d’Ele nessa harmonia, contemplam pela primeira vez, extasiados, a alma de sua Rainha.

Para terem ideia do que é isso, imaginem uma soberana que entra pela primeira vez na capital do seu reino, numa carruagem de gala, precedida de lanceiros, de trombeteiros, seguida de toda a corte, e a cidade inteira considera extasiada a beleza da rainha.

Isso é nada em comparação com a entrada de Nossa Senhora na corte angélica. No primeiro momento em que Maria Santíssima existiu, Ela teve conhecimento inteiro e lúcido de tudo, e conheceu a Deus. E no instante em que conheceu o Criador, Ela fez um ato de amor, que foi o mais perfeito que se tenha dado a Deus até então; de tal maneira que nunca nenhum Anjo fez ao Criador um ato de amor como Ela.

Ela adorou a Deus, Lhe deu ação de graças e Lhe ofereceu uma reparação pelos pecados dos homens. E esse cântico de Nossa Senhora, um cântico novo, a mais alta oração que jamais o Céu poderia fazer, foi para os Anjos a entrada da sua Rainha. Compreendemos, então, o que foi para os Anjos a festa da Imaculada Conceição.

Nós podemos unir as nossas vozes às dos Anjos no dia da Imaculada Conceição. Segundo as revelações de Santa Gertrudes, Santa Mectilde, Santa Brígida, quando a Igreja festeja um mistério na Terra, no Céu os Anjos acompanham. Portanto, no dia da Imaculada Conceição todos os Anjos vão glorificar Nossa Senhora.

Nós também podemos dar essa glória a Maria Santíssima, dentro do nosso espírito especialmente. Por que dentro do nosso espírito? A Imaculada Conceição é Aquela que calcou aos pés a cabeça do dragão. Aparecendo, Nossa Senhora venceu o dragão porque estava concebida sem o pecado original e, então, se preparava para dar à luz o Messias.

Nossa Senhora da Imaculada Conceição é, debaixo de vários pontos de vista, Nossa Senhora da Contra-Revolução, tornando o demônio esmagado, arrasado. É nesse sentido que nós devemos celebrar mais especialmente esta festa.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 7/12/1966)
Revista Dr Plinio 225 – Dezembro de 2016

Modelo de combate ao pecado

Concebida sem pecado original, Nossa Senhora não sentia em si nenhuma inclinação para o que fosse ruim.

Pelo contrário, tinha toda a facilidade para dar à graça de Deus uma perfeita e constante correspondência. Tinha, igualmente, uma altíssima noção das excelências  do Senhor, e da Glória que Ele devem render todas as criaturas. Por isso nutria em sua, alma vivíssimo horror ao pecado, que é um, ultraje à mesma glória divina. Donde possuir também, uma ardorosa combatividade, no sentido de execrar  toda forma do mal.

Compreende-se, à vista disto, por que Nossa, é comparada a um exército em ordem de batalha: “castrorum acies ordinata”.

Ou, como d’Ela se diz, que sozinha esmagou todas as heresias na terna inteira. Exatamente porque, já no privilégio de sua Imaculada Conceição, Ela é modelo de combate ao mal.

Plinio Corrêa de Oliveira

 

A santa intrasigência, um aspecto da Imaculada Conceição

No presente artigo, publicado pela primeira vez em setembro de 1954, Dr. Plinio descortina ante nossos olhos, as incomparáveis virtudes de Nossa Senhora e a apresenta como perfeito exemplo a ser seguido.

O vocabulário humano não é suficiente para exprimir a santidade de Nossa Senhora. Na ordem natural, os Santos e os Doutores A comparam ao Sol. Mas se houvesse algum astro  inconcebivelmente mais brilhante e mais glorioso do que o Sol, é a esse que A comparariam. E acabariam por dizer que este astro daria dela uma imagem pálida, defeituosa, insuficiente. Na ordem moral, afirmam que Ela transcendeu de muito todas as virtudes, não só de todos os varões e matronas insignes da Antiguidade, mas — o que é incomensuravelmente mais — de todos os Santos da Igreja Católica.

Imagine-se uma criatura tendo todo o amor de São Francisco de Assis, todo o zelo de São Domingos de Gusmão, toda a piedade de São Bento, todo o recolhimento de Santa Teresa, toda a sabedoria de São Tomás, toda a intrepidez de Santo Inácio, toda a pureza de São Luiz de Gonzaga, a paciência de um São Lourenço, o espírito de mortificação de todos os anacoretas do deserto: ela não chegaria aos pés de Nossa Senhora.

Mais ainda. A glória dos Anjos é algo de incompreensível ao intelecto humano. Certa vez, apareceu a um Santo o seu Anjo da Guarda. Tal era sua glória, que o Santo pensou que se tratasse do próprio Deus, e se dispunha a adorá-lo, quando o Anjo revelou quem era. Ora, os Anjos da Guarda não pertencem habitualmente às mais altas hierarquias celestes. E a glória de Nossa Senhora está incomensuravelmente acima da de todos os coros angélicos.

Poderia haver contraste maior entre esta obra-prima da natureza e da graça, não só indescritível mas até inconcebível, e o charco de vícios e misérias, que era o mundo antes de Cristo?

A Imaculada Conceição

A esta criatura dileta entre todas, superior a tudo quanto foi criado, e inferior somente à Humanidade Santíssima de Nosso Senhor Jesus Cristo, Deus conferiu um privilégio incomparável, que é a Imaculada Conceição.

Em virtude do pecado original, a inteligência humana se tornou sujeita a errar, a vontade ficou exposta a desfalecimentos, a sensibilidade ficou presa das paixões desregradas, o corpo, por assim dizer, foi posto em revolta contra a alma.

Ora, pelo privilégio de sua Conceição Imaculada, Nossa Senhora foi preservada da mancha do pecado original desde o primeiro instante de seu ser. E, assim, n’Ela tudo era harmonia profunda, perfeita, imperturbável. O intelecto jamais exposto a erro, dotado de um entendimento, uma clareza, uma agilidade inexprimíveis, iluminado pelas graças mais altas, tinha um conhecimento admirável das coisas do Céu e da Terra. A vontade, dócil em tudo ao intelecto, estava inteiramente voltada para o bem e governava plenamente a sensibilidade, que jamais sentia em si, nem pedia à vontade algo que não fosse plenamente justo e conforme à razão. Imagine-se uma vontade naturalmente tão perfeita, uma sensibilidade naturalmente tão irrepreensível, esta e aquela enriquecidas e superenriquecidas de graças inefáveis, perfeitissimamente correspondidas a todo momento, e se pode ter uma ideia do que era a Santíssima Virgem. Ou antes se pode compreender por que motivo nem sequer se é capaz de formar uma ideia do que é a Santíssima Virgem.

Intransigência absoluta

Dotada de tantas luzes naturais e sobrenaturais, Nossa Senhora conheceu por certo a infâmia do mundo em seus dias. E com isto amargamente sofreu. Pois quanto maior é o amor à virtude tanto maior é o ódio ao mal.

Ora, Maria Santíssima tinha em si abismos de amor à virtude, e, portanto, sentia forçosamente em si abismos de ódio ao mal. Maria era pois inimiga do mundo, do qual viveu alheia, segregada sem qualquer mistura nem aliança, voltada unicamente para as coisas de Deus.

O mundo, por sua vez, parece não ter compreendido nem amado Maria. Pois não consta que Lhe tivesse tributado admiração proporcionada a sua formosura castíssima, a sua graça nobilíssima, a seu trato dulcíssimo, a sua caridade sempre exorável, acessível, mais abundante do que as águas do mar e mais suave do que o mel.

E como não haveria de ser assim? Que compreensão poderia haver entre Aquela que era toda do Céu, e aqueles que viviam só para a Terra? Aquela que era toda fé, pureza, humildade, nobreza, e aqueles que eram todos idolatria, ceticismo, heresia, concupiscência, orgulho, vulgaridade? Aquela que era toda sabedoria, razão, equilíbrio, senso perfeito de todas as coisas, temperança absoluta e sem mácula nem sombra, e aqueles que eram todos desmando, extravagância, desequilíbrio, senso errado, cacofônico, contraditório, berrante a respeito de tudo, e intemperança crônica, sistemática, vertiginosamente crescente em tudo? Aquela que era a fé levada por uma lógica adamantina e inflexível a todas as suas consequências, e aqueles que eram o erro levado por uma lógica infernalmente inexorável, também a suas últimas consequências? Ou aqueles que, renunciando a qualquer lógica, viviam voluntariamente num pântano de contradições, em que todas as verdades se misturavam e se poluíam na monstruosa interpenetração de todos os erros que lhe são contrários?

“Imaculado” é uma palavra negativa. Ela significa etimologicamente a ausência de mácula, e pois de todo e qualquer erro por menor que seja, de todo e qualquer pecado por mais leve e insignificante que pareça. É a integridade absoluta na fé e na virtude. É portanto a intransigência absoluta, sistemática, irredutível, a aversão completa, profunda, diametral a toda a espécie de erro ou de mal. A santa intransigência na verdade e no bem é a ortodoxia, a pureza, enquanto em oposição à heterodoxia e ao mal. Por amar a Deus sem medida, Nossa Senhora correspondentemente amou de todo o coração tudo quanto era de Deus. E porque odiou sem medida o mal, odiou sem medida Satanás, suas pompas e suas obras, o demônio, o mundo e a carne.

Nossa Senhora da Conceição é Nossa Senhora da santa intransigência.

Verdadeiro ódio, verdadeiro amor

Por isto, Nossa Senhora rezava sem cessar. E segundo tão razoavelmente se crê, Ela pedia o advento do Messias, e a graça de ser uma serva daquela que fosse escolhida para Mãe de Deus.

Pedia o Messias, para que viesse Aquele que poderia fazer brilhar novamente a justiça na face da Terra, para que se levantasse o Sol divino de todas as virtudes, espancando por todo o mundo as trevas da impiedade e do vicio.

Nossa Senhora desejava, é certo, que os justos vivendo na Terra encontrassem na vinda do Messias a realização de seus anseios e de suas esperanças, que os vacilantes se reanimassem, e que de todos os países, de todos os abismos, almas tocadas pela luz da graça levantassem voo para os mais altos píncaros da santidade. Pois estas são por excelência as vitórias de Deus, que é a Verdade e o Bem, e as derrotas do demônio, que é o chefe de todo erro e de todo mal. A Virgem queria a glória de Deus por essa justiça que é a realização na Terra da Ordem desejada pelo Criador.

Mas, pedindo a vinda do Messias, Ela não ignorava que Ele seria a Pedra de escândalo, pela qual muitos se salvariam e muitos receberiam também o castigo de seu pecado. Esse castigo do pecador irredutível, esse esmagamento do ímpio obcecado e endurecido, Nossa Senhora também o desejou de todo o coração, e foi uma das consequências da Redenção e da fundação da Igreja, que Ela desejou e pediu como ninguém, “Ut inimicos Sanctae Ecclesiae humiliare digneris, Te rogamus, audi nos”, canta a Liturgia. E antes da Liturgia, por certo, o Coração Imaculado de Maria já elevou a Deus súplica análoga, pela derrota dos ímpios irredutíveis.

Admirável exemplo de verdadeiro amor, de verdadeiro ódio.

Onipotência suplicante

Deus quer as obras. Ele fundou a Igreja para o apostolado. Mas acima de tudo quer a oração. Pois a oração é a condição da fecundidade de todas as obras. E quer como fruto da oração a virtude.

Rainha de todos os apóstolos, Nossa Senhora é entretanto principalmente o modelo das almas que rezam e se santificam, a Estrela Polar de toda meditação e vida interior. Pois, dotada de virtude imaculada, Ela fez sempre o que era mais razoável, e se nunca sentiu em Si as agitações e as desordens das almas que só amam a ação e a agitação, nunca experimentou em Si, tampouco, as apatias e as negligências das almas frouxas que fazem da vida interior um para-vento a fim de disfarçar sua indiferença pela causa da Igreja. Seu afastamento do mundo não significou um desinteresse pelo mundo. Quem fez mais pelos ímpios e pelos pecadores do que Aquela que, para os salvar, voluntariamente consentiu na imolação crudelíssima de seu Filho infinitamente inocente e santo?

Quem fez mais pelos homens do que Aquela que conseguiu se realizasse em seus dias a promessa do Salvador?

Mas, confiante sobretudo na oração e na vida interior, não nos deu a Rainha dos Apóstolos uma grande lição de apostolado, fazendo de uma e outra o seu principal instrumento de ação?

Aplicação a nossos dias

Tanto valem aos olhos de Deus as almas que, como Nossa Senhora, possuem o segredo do verdadeiro amor e do verdadeiro ódio, da intransigência perfeita, do zelo incessante, do espírito de renúncia completo, que propriamente são elas que podem atrair para o mundo as graças divinas.

Estamos numa época parecida com a da vinda de Jesus Cristo à Terra. Em 1928 escreveu o Santo Padre Pio XI que “o espetáculo das desgraças contemporâneas é de tal maneira aflitivo, que se poderia ver nele a aurora deste início de dores que trará o homem do pecado, elevando-se contra tudo quanto é chamado Deus e recebe a honra de um culto” (Encíclica Miserentissimus Redemptor, de 8 de maio de 1928).

Que diria ele hoje?

E a nós, que nos compete fazer? Lutar em todos os terrenos permitidos, com todas as armas lícitas. Mas antes de tudo, acima de tudo, confiar na vida interior e na oração. É o grande exemplo de Nossa Senhora.

O exemplo de Nossa Senhora, só com o auxílio de Nossa Senhora se pode imitar. E o auxílio de Nossa Senhora, só com a devoção a Nossa Senhora se pode conseguir. Ora, a devoção a Maria Santíssima no que de melhor pode consistir, do que em Lhe pedirmos não só o amor a Deus e o ódio ao demônio, mas aquela santa inteireza no amor ao bem e no ódio ao mal, em uma palavra, aquela santa intransigência, que tanto refulge em sua Imaculada Conceição?

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de “Catolicismo” de setembro de 1954)

Devoção mariana contrarrevolucionária

A devoção mariana deve se caracterizar também pelo espírito combativo, como o demonstra uma escultura medieval representando Nossa Senhora, com espada na mão, investindo contra o demônio. A piedade adocicada e sem luta surgiu com o Renascimento, fazendo com que os contrarrevolucionários se tornassem moles.

 

A consideração da Imaculada Conceição de Maria toca no tema do embate entre a Revolução e a Contra-Revolução no que tem de mais profundo.

Em relação à Revolução, é preciso ter uma oposição total e vigorosa

Se há tanta gente que é preguiçosamente contrarrevolucionária, isso se deve exatamente ao fato de que para ser contrarrevolucionário é preciso realizar um esforço. O homem, por sua própria natureza, pode ter algumas tendências contrarrevolucionárias. Entretanto, por outro lado, possui várias tendências revolucionárias e, por causa disso, é obrigado a desenvolver uma ação em si mesmo muito categórica, profunda, pela qual não só ele se abstenha de todas as ações revolucionárias, mas também de todos os pensamentos revolucionários, bem como de qualquer forma de simpatia ou menor rejeição para com coisas revolucionárias.

Assim, detestar uma coisa qualquer revolucionária – um monumento, por exemplo – menos do que a carga de Revolução existente naquilo exige, já é um fator para que a atitude contrarrevolucionária da alma amoleça e não tenha todo o vigor devido.

Em presença do mal e, portanto, da Revolução que se exprime, se simboliza por tal objeto ou se manifesta em tal indivíduo, escola literária, de pintura, etc., deve-se conhecer todo o mal que há ali e detestá-lo tanto quanto precisa ser detestado. Se uma pessoa tomar perante esse mal uma posição preguiçosa, indolente, que proporcione uma rejeição menor do que aquela que ele merece, naquilo em que o mal não foi detestado tanto quanto merece a pessoa acaba gostando de alguma coisa revolucionária.

Essa pílula de Revolução que a alma assim engole é suficiente para amolecer nela todas as energias contrarrevolucionárias, e fazer com que o indivíduo desenvolva um esforço que ele imagina colossal para ser contrarrevolucionário, mas não consegue ser se ele não se esforçou para combater tendências más, revolucionárias, que há nele. Porém esse combate é inútil enquanto o homem não combate tudo, não elimina tudo, porque um pouquinho que fique cria uma insistência revolucionária colossal diante dele. Ele é obrigado a desenvolver um esforço enorme para não capitular, mas está sempre voltando ao pé da mesma luta. O indivíduo toma uma atitude contrarrevolucionária, mas não é inteiramente contrarrevolucionário. Na primeira ocasião, ele vai estimar uma coisa revolucionária ou detestá-la menos do que ela merece porque, num outro ponto, foi mole com a Revolução.

Quer dizer, ou existe em relação à Revolução uma oposição total, tão vigorosa quanto ela merece em cada ponto dela, ou o indivíduo amolece.

Análise de um busto de Maria Antonieta

Isso um pouco se dá com o bem e o mal em geral, por exemplo a pureza. Eu já tenho visto pessoas que lutam seriamente para manter a castidade. Às vezes combatem de um modo a ficarmos espantados de ver como elas mantêm a pureza. Mas é uma luta que não é tão séria porque, em muitos casos – não quero dizer que seja sempre assim –, a pessoa em algum ponto conserva uma certa complacência para com a impureza. E isto faz com que, em outros pontos, ela tem para com a impureza uma moleza que não deveria ter. Então ela possui uma tendência para o pecado que não se explica à primeira vista, porque ela consegue com esforço enorme não cometer uma ação pecaminosa, mas vai-se ver no fundo esse esforço é tão grande por causa de uma conivência, uma complacência em que ela consentiu e que determina todo o resto.

Recentemente vi a fotografia de uma porcelana, feita pela famosa fábrica de Sèvres, representando um busto de Maria Antonieta com toda a grandeza que ela tem, mas com uma frieza extraordinária e uma espécie de desdém o qual afasta as pessoas que não estejam inteiramente à altura de estar na presença de uma Rainha da França como ela.

Maria Antonieta provavelmente teve atitudes de alma que correspondiam a isso, mas ela não era só isto nem principalmente isto. O charme e a graça dela foram aclamados e festejados pela Europa inteira. E quem fala em charme e em graça fala evidentemente em afabilidade, em gentileza, em aprazibilidade; uma presença que tem charme é agradável. E em algo a presença desse busto de Maria Antonieta não é agradável porque é de uma rigidez que deixa aparecer a majestade dela em toda a linha, mas sem aquilo que é o complemento harmônico da majestade régia o qual, antes de começar a “máfia” revolucionária contra ela, foi cantado em prosa e verso pela nação francesa, de todos os modos possíveis.

Resultado, a pessoa pega um busto desses, olha e diz:

“Está vendo? Aqui é evidente que ela foi isto. Esses revolucionários, coitados, certa razão tinham para fazer o que fizeram ou para serem como foram. E não se deve ser tão rigoroso no julgamento deles.”

Essa é uma conclusão injusta, não tem fundamento e leva a achar que o crime praticado pela Revolução contra Maria Antonieta tinha alguns lados de um ato de justiça. E em algo se deve ter pena daqueles agitadores ululantes e facinorosos que levaram Maria Antonieta à situação extrema a que ela foi conduzida.

Rainha que foi morta devido às qualidades que possuía

Ao olhar para uma fotografia desse busto, trazida por um amigo, e considerando tratar-se de um busto que, do ponto de vista artístico, é muito apreciável, a pessoa pode conservá-la como um marcador de livros, por exemplo. Uma vez ou outra, ao ler aquele livro, ela vai olhar a fotografia e aquela impressão se radica nela. Quando chegar a ocasião em que essa pessoa precise dar um curso de História, isso vai pesar de um modo revolucionário nesse curso.

Isso porque a pessoa foi mole no considerar esse busto, não tomou em consideração que era unilateral, apresentava um aspecto de Maria Antonieta, que a sua pessoa não podia ser julgada só segundo esse lado, pois ela tinha muitos outros aspectos relevantíssimos. E, sobretudo, é certo que não foi por isso que ela foi morta pela Revolução, mas pelas qualidades que ela possuía, pelo que havia de bom nela, porque a Revolução nunca combate o mal e jamais executa um ato de justiça contra o mal. Quando ela aponta um mal em alguém e finge combater esse mal é porque, no fundo, está combatendo um bem que existe naquela pessoa. Porque a Revolução é um movimento satânico, e satanás não é capaz de outro procedimento.

Portanto, a priori, sabendo o que foi a Revolução, devemos entrar no julgamento da coisa revolucionária certos de que, embora naqueles em que a Revolução executou violências havia coisas a punir, não foi esta a razão da punição; e nem sequer foi uma punição. Essas pessoas foram perseguidas pelos seus lados bons. Não considerar isso é ver a Revolução como ela não é.

Onde falta a luta há um dolo, uma fraude

Ora, isso exige uma firmeza, uma retidão de vontade, uma disposição de combater, uma oposição contrarrevolucionária completa que a maior parte das almas tem preguiça de ter. E por causa disso essas almas se deixam levar para baixo.

É por isso também que, por exemplo, chegando festas como a Imaculada Conceição, nós não tomamos em consideração as coisas que sabemos como teologicamente são, ou pelo menos podem ser vistas debaixo de um certo aspecto e que assim devem ser examinadas.

A imagem da Imaculada Conceição mais frequentemente difundida é a de Murillo. Esse quadro representa Nossa Senhora em pé sobre nuvens, num gesto de completo enlevo para com Deus, com as mãos postas e pensando só n’Ele. Como Rainha que está presente no seu reino e, portanto, completamente distendida, despreocupada, no terreno que Ela domina inteiramente, sentindo-Se objeto de todo o amor e comprazimento de Deus, de maneira que o amor que o Criador tem a todas as outras criaturas somadas não dá o amor que Ele tem a Ela, nem de longe.

A pessoa olha esse quadro e diz: “Que admirável!”

O contrarrevolucionário completo afirma: “É um quadro onde o combate não está presente, portanto, na realidade total, falta-lhe alguma coisa. E no representar a Imaculada Conceição alguma coisa falta. Tudo o que o quadro quer representar, Nossa Senhora tem, está presente. Mas, há algum lado para o qual não se pode fechar os olhos: a luta”.

Onde falta a luta o contrarrevolucionário percebe que há um dolo, uma fraude, que a verdade inteira não está ali.

Na realidade o que nos diz Cornélio a Lápide?

Ele não dá – tanto quanto eu me lembro, pelo menos – uma sentença como certa, mas apresenta como sentença aceita por muitos teólogos eminentes, cujos nomes e obras ele indica, o seguinte: Os que estão no Inferno têm um conhecimento sem delícias, sem alegria, sem amor, amargurado que, pelo contrário, dá-lhes uma situação de desagrado profundo do que se passa no Céu. Eles veem, quer dizer, conhecem Nossa Senhora posta na presença do Altíssimo e inundada de felicidade, etc., e o ódio neles aumenta. E do fundo do Inferno blasfemam contra Ela. Em oposição a essas blasfêmias Maria Santíssima executa neles um ato de justiça, mandando que outros Bem-aventurados respondam a elas. E se trava uma espécie de polêmica, de luta, não à maneira da batalha que houve no Céu quando satanás foi mandado embora por São Miguel Arcanjo, mas uma controvérsia em que os Bem-aventurados aclamam ainda mais a Ela por causa das blasfêmias que os precitos soltaram, e uma atmosfera de combate se torna notória no Céu, e Nossa Senhora é a vencedora que esmaga com o seu calcanhar a cabeça da serpente.

Assim o quadro da Imaculada estaria completo.

Guerra atormentante contra o maligno

Alguém poderá dizer: “Não, Dr. Plinio, devagar! O quadro de Murillo apresenta Nossa Senhora esmagando a cabeça da serpente”.

Não me lembro, mas é facilmente possível. Entretanto, Murillo A pinta como tão enlevada com Deus que nem toma conhecimento dos insultos do demônio. Aquilo é a última ralé para a qual Ela não liga e, portanto, é muito teológico que Ela seja apresentada não pensando no demônio. Se Ela tem a sua glória em que o demônio seja escarnecido, receba o ato de justiça com o vilipêndio atirado sobre ele, é justo que Ela tenha consciência disto. E que em reparação a Deus, que Maria Santíssima sabe estar sendo insultado por esse ato do demônio, Ela faça um ato de adoração. Um ato de adoração pleno como só Ela é capaz de fazer e tem os recursos para realizar, mas no qual o conhecimento da situação belicosa e a participação nesta guerra atormentante do demônio esteja presente dentro d’Ela.

Suponhamos que um católico coloque um quadro desses no retábulo da capela do seu oratório particular em casa. Ao rezar ele não tem a noção da atmosfera de luta em que todos os precitos, todos os demônios que estão no Inferno uivam contra Nossa Senhora, ao menos em certas ocasiões em que Ela majestaticamente, eu ousaria dizer – é impróprio porque Ela é tão maior do que qualquer outra criatura, que a comparação não está bem – “carolingiamente”, mete o pé em cima deles e os esmaga, e isso se dá gloriosamente.

O católico deve ter isso diante dos olhos pelo menos algumas vezes, e precisa sentir que falta alguma coisa quando, na sua devoção mariana, isso jamais lhe passa pela mente.

A Santíssima Virgem, usando um gládio, luta contra o demônio

Nunca me ensinaram isso e eu sentia que, na minha devoção à Nossa Senhora, faltava alguma coisa que procurava e não entendia o que era. Até que os meus olhos caíram sobre esse texto de Cornélio a Lápide.

Eu ali senti que havia um recôncavo da minha alma que estava vazio do necessário da devoção à Santíssima Virgem, e exultei porque me senti cheio de Nossa Senhora. E acho que a devoção contrarrevolucionária a Ela comporta este aspecto de um modo relevante.

Não quero dizer que a imagem ou o quadro, enfim a reprodução, que não se refira a isto seja censurável. Afirmo outra coisa: que quase nunca se veja isto é censurável.

Há uma escultura medieval, representando uma lenda, em que Nossa Senhora está defendendo, com espada na mão, uma alma que o demônio quer roubar. É, portanto, a Santíssima Virgem em luta contra o demônio, mas usando um gládio.

O efeito do Renascimento foi o de passar um pano molhado sobre todas essas realidades. E daí haver essa forma de piedade adocicada e sem luta, fazendo com que a Contra-Revolução não tenha lutadores. Os contendores estão do lado de lá, eles são ferozes; do lado de cá tem essa água com açúcar que conhecemos.

Mas volto a dizer, não é porque quando uma explanação de Nossa Senhora não se refere a isso seja água com açúcar, isso não é verdade. Mas é verdade que no conjunto das noções sobre Nossa Senhora deve-se ter isto presente, sob pena de não sermos verdadeiramente contrarrevolucionários. Tenho certeza de que o nosso espírito contrarrevolucionário brilha especialmente se tivermos o cuidado de sempre ter em vista que Nossa Senhora é assim.

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 6/12/1992)

Aspecto militante do privilégio da Imaculada Conceição

Quando Adão e Eva pecaram, antes que Deus os expulsasse do Paraíso e promulgasse as penas às quais estariam sujeitos, revelou-lhes a missão de Maria Santíssima, que viria ao mundo para esmagar a cabeça da infernal serpente.

Esta inimizade, criada pelo próprio Deus, permanece viva ao longo dos séculos entre os que são da Virgem e os sequazes de satanás. Por isso, não é de admirar que o dogma da Imaculada Conceição tenha causado não pequeno rebuliço. Sobre este aspecto, comenta Dr. Plinio:

Quando o dogma da Imaculada Conceição foi definido por Pio IX, houve uma verdadeira tempestade de ódios, protestos, indignação. Como explicar esse furor?

Vejam o conteúdo do dogma: Maria Santíssima foi concebida sem pecado original, desde o primeiro instante de seu ser.

Ela, como Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo, mais recentemente também como Mãe da Igreja, é odiada pelo ódio igualitário de vê-La colocada no ponto mais alto em que uma mera criatura possa estar. Ainda mais sendo uma mulher, e onde, portanto, o arbítrio de Deus se apresenta de um modo muito mais forte.

Isso fere enormemente o igualitarismo, como também a ideia de que esta criatura tenha sido objeto de uma exceção a uma regra para a qual nunca houve exceção, e tenha sido concebida sem pecado original desde o primeiro instante de seu ser.

Não é só a aversão ao aspecto anti-igualitário, mas é um ódio em relação ao que é sublime. Nossa Senhora concebida sem pecado original, Mãe de Deus, tudo isso considerado no seu conjunto é de uma sublimidade de tal maneira pura, imaculada, elevada, virginal, que transcendente a tudo em matéria de sublimidade.

O espírito revolucionário odeia tudo quanto é sublime, tudo quanto é elevado, e não somente por ser ele igualitário, mas por outra expressão que é o amor ao banal, ao trivial, quando não é o amor ao degradado. Daí decorre um verdadeiro ódio contra a Imaculada Conceição de Nossa Senhora.

Ao considerar a Festa da Imaculada Conceição, devemos pedir Maria Santíssima que nos dê cada vez mais essa bem-aventurança: sermos de tal maneira unidos a Ela, de trazermos em torno de nós de tal maneira a expressão d’Ela, que se possa dizer que realmente é por causa d’Ela que somos odiados, por causa daquilo que em nós existe de semelhante a Ela. Isto nós devemos pedir com muito afinco.

Imaculada Conceição, intransigência e combatividade

Uma incomparável noção do bem e do mal. Nascidas desta altíssima noção, a intransigência e a combatividade de Maria servem de modelo para toda a humanidade.

Um comentário que poderíamos fazer a respeito da Imaculada Conceição de Maria seria considerá-La enquanto modelo de insuperável combatividade e intransigência. No que consiste a combatividade e a intransigência, e por que podemos dizer que Nossa Senhora é, enquanto concebida sem pecado original, o modelo dessas virtudes?

Da compreensão e do amor a um nobre ideal nasce a intransigência

A intransigência consiste no seguinte: quando temos inteiramente claro no espírito o que é o bem e como algo deve ser para podermos considerá-lo bom; e quando temos essa noção levada até o ponto de sublimidade, compreendendo a mais alta expressão do bem a respeito daquilo, nasce, então, na defesa desta ideia, a intransigência.

Tomemos, por exemplo, a figura de um bom sacerdote. Uma pessoa que compreenda, em toda a sua sublimidade, a vocação sacerdotal, a virtude de que deve estar imbuído o sacerdote, e forme uma ideia profunda — não uma mera impressão colhida superficialmente — da alta realidade contida nesse estado de vida, ela se torna verdadeiramente intransigente em relação a tudo quanto toca no sacerdócio. Porque, como a pessoa compreendeu e amou um ideal altíssimo, necessariamente ela lançará uma condenação severíssima sobre aquilo que contradiga esse ideal. Por ter compreendido e amado esse bem até o fim, a pessoa pode perceber e sondar toda a malícia que há no contrário, rejeitando este completamente, de modo intransigente, ou seja, não o tolerando.

No contraste com o mal se percebe melhor a excelência do bem

Esta é a intransigência que procede, precisamente, dessa elevada concepção e nobre aceitação da coisa verdadeira e boa, e que gera, então, a rejeição daquilo que é ruim.

Por causa da estrutura do espírito humano, pode-se dizer que de algum modo, formada a intransigência, a visão e a consideração do mal reforçam o amor ao bem. Porque, no contraste com o mal, a pessoa percebe melhor a excelência do bem, encontrando assim um meio de amá-lo ainda mais.

O contrarrevolucionário, entendendo bem, nos seus mais altos aspectos, toda a grandeza da causa à qual se dedica, pode também perceber perfeitamente a dignidade e a excelência dessa vocação, e o que ela exige de quem a recebe. Por isso, ele forma dessa vocação uma ideia altíssima e muito amada por ele, o que o torna intransigente em relação a todas as fraquezas, todas as deficiências na vocação, e para com todos aqueles que, de fora, procuram atrapalhá-la.

Portanto, dessa alta ideia nasce uma recusa ao oposto, mas, na consideração do mal, essa mesma ideia ainda recebe um reforço.

Combatividade, filha da intransigência

A combatividade é uma consequência da intransigência. Quem é inteiramente intransigente deve querer o extermínio completo do mal que ele tem em vista. Do contrário, ele não seria intransigente. Por isso, o desejo de extinguir aquele mal deve encher sua vida como um verdadeiro ideal, não sossegando enquanto não tiver liquidado aquele erro que, de fato, ele queria liquidar.

Surge, então, a combatividade, isto é, aquele desejo de eliminar o mal efetivamente, sem deixar vestígios nem raízes, de maneira que nunca mais possa renascer. Derrotar o mal a ponto de envergonhá-lo, causando em quem considere essa derrota, um horror ao mal e um amor ao bem ainda maiores. Esta posição é, propriamente, a combatividade, filha da intransigência.

”Reduzir a pó pelo fogo”

No Direito português antigo havia uma expressão que indicava de um modo muito sintomático essa execração ao mal: “reduzir a pó pelo fogo”. Na época em que se aplicava a pena de morte, quando um réu era condenado por um crime horroroso, matavam-no — às vezes de um modo cruel, aos poucos, com pauladas ou por meio do tormento da roda —, queimavam seu corpo até reduzi-lo a cinzas, as quais eram, depois, jogadas no mar. Quer dizer, não sobrava nada.

Eis uma imagem da combatividade verdadeira que não quer que reste nem as cinzas, mas apenas uma recordação de horror daquele mal praticado.

Não me refiro à eliminação da pessoa, mas tenho em vista algo muito mais importante e difícil: é a extinção de um mau costume, de uma lei iníqua, de uma ideia má, de uma doutrina falsa. Matar um homem, numa hora de cólera, qualquer um é capaz de matar; há muitos criminosos que assassinam pessoas por aí. Mas querer acabar com uma instituição perversa, uma ideia errada, enfim, com o mal, este é o ponto característico da combatividade nascida da intransigência. Por vezes, essa combatividade poderá ser fria, porém será sempre inexorável.

Modelo de intransigência e combatividade

Qual a relação entre o que até aqui foi exposto e a Imaculada Conceição?

Nossa Senhora, sendo concebida sem pecado original, não tinha em Si absolutamente nada que fosse ruim. E possuía, nesta Terra, todas as facilidades para dar à graça de Deus uma correspondência perfeita a todo momento. De maneira que n’Ela a grandeza natural e a grandeza sobrenatural entravam em uma fusão, em uma harmonia profunda e estupenda.

Em consequência, a Santíssima Virgem estava dotada, como ninguém, de uma elevadíssima noção da glória e da santidade de Deus, da obrigação que têm todas as criaturas de darem glória a Deus; e, por causa disso, um altíssimo horror àquilo que o pecado representa. Donde uma combatividade acendrada, no sentido de execrar toda forma de mal.

Compreendemos, assim, por que Nossa Senhora é comparada a um exército em ordem de batalha: “castrorum acies ordinata”. E também a razão pela qual d’Ela se diz que, sozinha, esmagou todas as heresias em toda a Terra: é exatamente porque Maria Santíssima é o modelo da intransigência e da combatividade, virtudes estas que podemos compreender melhor através do privilégio de sua Conceição Imaculada.

Ao comemorarmos, pois, a Imaculada Conceição de Maria, devemos pedir um altíssimo grau de amor que nos leve a querermos ser intransigentes de um modo insondável, a um ponto inconcebível.

Lembro-me de Santa Teresinha do Menino Jesus manifestar, na “História de uma alma”, o pesar que ela sentia por não poder ser um guerreiro que, até nos confins da Terra, estivesse manejando a lança contra os inimigos de Deus. É assim a alma de um santo! Em todo lugar, quer verdadeiramente combater nas formas mais adequadas e legítimas do combate.

Portanto, nós devemos pedir hoje esse lampejo de combatividade ligado à santidade, correspondente à forma especial de pureza daqueles que verdadeiramente são filhos e procuram ter o espírito de Nossa Senhora.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 8/12/1966)

Imaculada Conceição

Santa desde o primeiro instante

Conforme a sentença comum dos teólogos, Nossa Senhora, concebida sem pecado original, foi dotada do uso da razão desde o primeiro instante de seu ser. Portanto, já no claustro materno possuía altíssimos e sublimíssimos pensamentos, nele vivendo como num verdadeiro tabernáculo.

Assim, pode-se acreditar que a Bem-aventurada Virgem, com a elevada ciência que recebera pela graça de Deus, ainda no seio de Sant’Ana começou a pedir a vinda do Messias e, com Ele, a derrota de todo mal no gênero humano.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 8/9/1963)
Revista Dr Plinio 117 – Dezembro de 2007

Pedindo a plenitude do espírito de Maria

Mãe nossa, Senhora do universo, obtende para nós do Menino-Deus, Vós que sois sua Mãe extremosa e sem mácula, uma contrição verdadeira e profunda por tantos pecados cometidos ao longo deste ano que se encerra, e que constituem sinais inequívocos de um transbordante egoísmo e de uma inquietante falta de amor de Deus.

Vós quisestes dobrar uma página de nossa história, tomando Vós mesma a iniciativa da reconquista de nossas almas. Acabai, pois, Senhora, a obra que começastes! Não se detenha vosso braço no início da tarefa, nem descansem vossos pés antes de atingir a meta. Comunicai-nos a plenitude de vosso espírito, preparai-nos para os grandes lances que se apresentam diante de nós.

Fazei com que o vosso espírito sagrado transponha os abismos de nossas misérias e infidelidades, como outrora o Verbo de Deus transpôs os abismos que O separavam da Criação para Se unir a Vós.

Sobretudo, Senhora, fazei com que a grande batalha profética se trave, que São Miguel venha e Vós vençais. Amém.

Plinio Corrêa de Oliveira
Revista Dr Plinio 261 (Dezembro de 2019)

Santa desde o primeiro instante

Conforme a sentença comum dos teólogos, Nossa Senhora, concebida sem pecado original, foi dotada do uso da razão desde o primeiro instante de seu ser. Portanto, já no claustro materno possuía altíssimos e sublimíssimos pensamentos, nele vivendo como num verdadeiro tabernáculo. Assim, pode-se acreditar que a Bem-aventurada Virgem, com a elevada ciência que recebera pela graça de Deus, ainda no seio de Sant’Ana começou a pedir a vinda do Messias e, com Ele, a derrota de todo mal no gênero humano.

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 8/9/1963)

Natal e Nossa Senhora

Na hora bendita entre todas as horas, de um modo só conhecido por Deus, a Mulher bendita entre todas as mulheres, a Feliz Porta do Céu e sempre Virgem — como A exalta o cântico “Ave Maris Stella” — torna-Se, efetivamente, Mãe de Deus, pois a maternidade se completa quando Maria Santíssima dá ao mundo o Filho que Ela gerou.

Há uma belíssima música de Natal que canta de modo muito expressivo, como uma melodia vinda do alto: “Aparuit! Aparuit!” Afinal, apareceu na manjedoura o Verbo de Deus encarnado!

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 2/7/1995)