Esplendor que reparava a imerecida miséria

São Silvestre foi o Papa a quem, tendo vivido no tempo de Constantino, coube presidir a transformação importante que foi o fato de a Igreja deixar de ser perseguida para ser rainha, abandonar as catacumbas e começar a ocupar palácios.

Ele foi o Pontífice que acompanhou o surgimento da Igreja para fora das catacumbas como um Sol que nasce. Sob suas diretrizes e inspiração teve início a obra pela qual a Igreja foi sendo cercada de um luxo e esplendor, que reparava os anos de imerecida miséria passados por ela nas catacumbas.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 30/12/1966)

Meditação sobre o Natal – II

Quais seriam nossas emoções se, logo após o nascimento de Jesus, entrássemos na gruta de Belém e contemplássemos a majestade, a acessibilidade e a misericórdia do Menino-Deus, bem como o ambiente que O cercava? Eis o tema do segundo estilo de meditação explanado por Dr. Plinio.

Passarei a fazer uma meditação inteiramente diversa da anterior(1) para, depois, efetuarmos a comparação.

Suponhamos que cada um de nós tivesse a alegria de entrar na gruta de Belém e ver Nossa Senhora com São José, o Menino Jesus, os pastores, o boi e o asno. E visse também os Reis Magos — entre os quais o Rei negro Baltazar — vindos do Oriente, se aproximando com suas caravanas, seus cortejos, a estrela; adoram o Menino-Deus e Lhe oferecem ouro, incenso e mirra.

Como imaginariam a cena? Sob que aspecto ela lhes causaria mais alegria na alma e por onde se sentiriam mais próximos do Divino Infante?

N’Ele, poderíamos considerar, entre muitos outros pontos, a infinita grandeza, a infinita acessibilidade, e também o infinito amor.

Infinita grandeza do Menino Jesus

Quanto a sua infinita grandeza, podemos imaginar uma gruta enorme, alta, quase como uma catedral, que não tivesse evidentemente uma arquitetura definida, mas suas pedras nos fizessem pressentir vagamente as ogivas de uma catedral da futura Idade Média. O berço do Menino Jesus estaria colocado bem no ponto majestoso da encruzilhada das várias naves laterais, naturais, e uma luz celeste toda de ouro pairaria sobre Ele naquele momento.

O Divino Infante, embora deitado em seu presepe e sendo uma criança, é o Rei de toda majestade e toda glória, o Criador do Céu e da Terra, Deus encarnado e feito Homem, tendo desde o primeiro instante de seu ser — portando já no ventre de Nossa Senhora —, mais grandeza, mais manifestação de força e de poder do que todos os homens que houve na Terra, incomparavelmente mais inteligente do que São Tomás de Aquino, mais poderoso do que Carlos Magno, Napoleão, Alexandre; Ele sabia todas as coisas extraordinariamente mais do que qualquer cientista moderno, e na fisionomia sempre variável do Menino Jesus, de vez em quando esta majestade feita de sabedoria, de santidade, de ciência, de poder, haveria de aparecer.

Então, imaginem que encontrassem isso misteriosamente expresso na fisionomia deste Menino. Que Ele, às vezes, se movesse e no seu movimento se percebesse um rei; abrisse os olhos e o fulgor de seu olhar tivesse uma profundidade tal que se sentisse n’Ele um grande sábio; haveria uma atmosfera circundando-O e que nimbasse de virtude todos aqueles que d’Ele se acercassem; algo puríssimo, de tal maneira que as pessoas não poderiam aproximar-se dali sem antes pedir perdão por seus pecados, mas ao mesmo tempo atraídas e incentivadas a se corrigirem de suas faltas, pela santidade que emanava daquele local.

Majestade de Nossa Senhora

E aos pés d’Ele Nossa Senhora, Ela também como uma verdadeira Rainha — a Virgem Santíssima era e é Rainha —, com uma dignidade e imponência, que não precisava de roupas nobres nem de tecidos de grande qualidade para se fazer valer.

Todos sabem que Santa Teresinha do Menino Jesus era tão imponente que seu pai a chamava “minha pequena rainha”. O jardineiro do Carmelo, no processo de canonização, contou uma vez que viu uma freira, que estava de costas, fazer tal coisa e era Santa Teresinha. Então o advogado do diabo perguntou: “Mas como o senhor sabia que esta freira, estando ela de costas, era Santa Teresinha?” A resposta foi: “Pela majestade da santa, porque ninguém possuía a majestade que ela teve”.

Podemos imaginar Nossa Senhora majestosíssima, transcendente, puríssima, rezando para o Menino Jesus, os Anjos invisivelmente cantando, em volta, canções de glorificação, e toda a atmosfera saturada de valores tais que se diria haver, naquela pobreza e miséria, um ambiente de corte.

E nós nos aproximando do presépio, sentindo a grandeza do Menino Deus e, como contrarrevolucionários que somos, amando n’Ele tudo quanto é nobre, belo, santo, intransigente e combativo; adorando aquele Menino que, ao mesmo tempo, atrai junto a Si todas as formas de grandeza que dimanam, são reflexos e uma participação na santidade d’Ele, e rechaça para longe de Si o pecado, o erro, a desordem, o caos, a Revolução, que nem sequer ousa levantar os olhos para aquela cena magnífica em que a ordem, a hierarquia, a pompa e o esplendor dominam completamente.

Acessibilidade do Divino Infante

Consideremos agora outro aspecto: o Menino Jesus imensamente acessível.

Suponhamos que esse Rei tão cheio de majestade, em certo momento abrisse os olhos para nós e notássemos — mas cada um deve imaginar-se visto por Ele — que o olhar puríssimo, inteligentíssimo, lucidíssimo do Divino Infante penetra em nossos olhos profundamente, vê o mais fundo de nossos defeitos bem como o melhor de nossas qualidades; e naquele momento toca a nossa alma, como tocou, trinta e três anos depois, a São Pedro, e nos dá uma tristeza profunda de nossos pecados.

Conta o Evangelho que o olhar de Nosso Senhor para São Pedro foi tal que este se retirou e chorou amargamente. Então, imaginemos o olhar d’Ele nos dando o horror de nossos defeitos e nos mostrando seu amor às nossas qualidades. E também o seu amor à nossa condição de criatura feita por Ele; apesar de nossos defeitos, fomos criados por Ele e destinados a um grau de santidade e perfeição, que o Menino Jesus conhece e ama enquanto podendo existir em nós.

De maneira que, embora pecadores, quando menos esperássemos, por um rogo amável de Nossa Senhora, Ele sorrisse para nós e, apesar de toda a sua majestade, sentíssemos as distâncias desaparecerem, o perdão que invade a nossa alma, e algo nos atraísse de tal forma que caminhássemos para junto do Menino-Deus, e Ele afetuosamente nos abraçasse e pronunciasse o nosso nome: “Fulano, Eu te quis e te quero tanto, desejo para ti tantas coisas, perdoo-te tanto, não pense mais nos teus pecados, daqui por diante pensa apenas em servir-Me. E em todas as ocasiões de tua vida, quando tiveres alguma dúvida, lembra-te dessa condescendência, dessa amabilidade, desse beneplácito e recorre a Mim por meio de minha Mãe, e Eu te atenderei, serei o teu amparo, a tua força que há de levar-te ao Céu para ali reinares ao meu lado por toda a eternidade”.

Sua compaixão sem limites

Imaginemos a misericórdia do Menino Jesus, olhando não só para o que há de bom e mau em nós, mas também para nossa tristeza, para a condição miserável de todo homem na Terra, para o sofrimento que cada um de nós traz em si, para o sofrimento passado e o sofrimento futuro que Ele conhece. Contemplando inclusive o risco que nossa alma corre de ir para o Inferno, para os tormentos eternos; todo homem, enquanto vive nesta terra, está exposto a ir para o Inferno. E o Divino Infante olhando para o Purgatório e os tormentos que ali nos aguardam, se não formos inteiramente fiéis. Então é um olhar de compaixão, de pena, de uma participação profunda na nossa dor; e um desejo de removê-la em toda medida que for possível, de nos dar forças para suportá-la na medida em que a dor for necessária para nos santificarmos.

Então, notarmos n’Ele aquilo que consola tanto o homem, e que Jesus não teve quando chegou sua hora de sofrer. Qualquer pessoa, no momento da dor — está na natureza humana e é reto —, se consola em ter alguém que sinta pena dela, pois a compaixão divide o sofrimento. O homem é feito de tal maneira que, quando ele está alegre e comunica a sua alegria, esta se duplica, quando está triste e comunica a sua tristeza, esta se divide. Assim também, e a “fortiori”, passa-se conosco em relação ao Menino Jesus.

Então, em todos os sofrimentos de nossa vida, quando a taça para beber for muito amarga, repetiríamos por meio de Maria Santíssima a oração de Nosso Senhor: “Meu Pai, se for possível afaste-se de Mim este cálice, mas faça-se a vossa vontade e não a minha”(2). Quer dizer, pediríamos, em todos os momentos, que a dor passasse, mas se fosse a vontade d’Ele a dor viesse sobre nós. Assim, durante nossos sofrimentos, teríamos compaixão d’Ele, como se nos dissesse: “Meu filho, Eu sofro contigo. Vamos padecer juntos porque sofri por ti, e há de chegar o momento em que tu participarás eternamente da minha alegria”. E o olhar compassível de Jesus não nos abandonará um momento em nossa existência.

Três presépios representando cada um desses aspectos

Então, ao fazermos essa meditação durante todo o tempo de Natal, ao longo das vicissitudes da existência quotidiana, devemos nos lembrar destes três pontos: a majestade infinita, a acessibilidade infinita, e a compaixão sem limites do Menino Jesus em relação a nós. E ter a recordação sensível, porque procuraríamos compor um pouco o quadro.

Alguém me diria: “Mas Dr. Plinio, o presepe não poderia ter esses três aspectos ao mesmo tempo”. Não é verdade. Em Nosso Senhor todas as perfeições, todos os estados de alma perfeitos coexistiam na sua natureza humana em graus e modos diversos, conforme as circunstâncias da vida. Portanto, Ele era cheio de majestade, de acessibilidade e de compaixão para com os homens desde o momento em que entrou na Terra. E é natural que, apesar de ser Menino, conforme as almas que d’Ele se acercassem, ora uma qualidade, ora outra, aparecesse.

Seria até muito bonito que numa igreja, em vez de um presépio, houvesse em três altares diferentes três presépios, em que as figuras e toda a ambientação representassem, em cada altar, um desses aspectos para facilitar às almas a meditação sobre esses pontos como, aliás, sobre outros que também se poderiam considerar.

Como pintar o olhar do Menino-Deus?

Aqui estaria um outro tipo de meditação sobre o Santo Natal. O primeiro é um estilo de meditação que chamaríamos mais teórico, mais doutrinário; o segundo seria uma recomposição mais sensível, tocando-nos mais de perto.

Na segunda meditação, há lógica também, pois sem lógica não há meditação; mas a parte do embebimento da fantasia, da sensibilidade para preparar o jogo da lógica é muito grande. A primeira é muito mais seca. Aí está a diferença entre as duas escolas. A geração posterior à minha é muito apetente de embebimento e de preparação desta natureza, conforme a segunda meditação.

Como eu gostaria de ter em nosso Movimento pintores ou desenhistas que soubessem, por exemplo, pintar três presépios de acordo com esta concepção, ostentando toda a grandeza, ou toda a acessibilidade, afabilidade, ou toda a compaixão de Nosso Senhor! Como seria bonito! Mas o difícil é que seria preciso saber pintar aquilo que é o centro do presépio: um Menino recém-nascido que, sem perder as características de menino, tivesse tudo isso e, sobretudo, um olhar onde essas perfeições se refletissem. Como pintar um olhar infantil capaz de dizer tudo isso? Antes de ser pintor, que psicólogo o artista precisa ser para imaginar este olhar! E, depois de imaginado, como pintar? Este seria o pintor que iniciaria nossa escola de pintura, porque tenho a impressão de que, no pintar expressões de olhar, nossa escola estaria largamente representada.

”Minha alma é eminentemente inaciana”

Essa meditação sobre o Santo Natal conduz à seguinte convicção: convém fazer um estilo e outro, porque há diversas vias espirituais, e não devemos nos fixar só num estilo. Vale a pena alternarmos, meditando ora de um modo, ora de outro, para atender aos anseios de todas as almas.

Se me perguntassem o que me impressiona mais, eu responderia que, embora tendo composto o segundo tipo, me impressiona mais o primeiro, talvez por ser mais próprio de minha geração ou do meu feitio de espírito. Aquilo que é inteiramente racional e que eu posso ver amarrado por um raciocínio inexorável, me enche e me basta. Compreendo que outros não sejam assim, a tal ponto que tomei o trabalho de compor, para uso de outros, uma meditação diferente, e dou o meu tempo por muito bem empregado.

Nessa opinião transparece a seguinte posição: na Igreja há várias escolas espirituais, todas aprovadas por ela. Em geral, inauguradas e seguidas por santos, essas escolas são esplêndidas, e cada um deve seguir o que sua alma lhe pede. Minha alma é eminentemente inaciana e o sistema de Santo Inácio me encanta. O raciocínio simples, claro, límpido, que conclui e que arrasta, e a respeito do qual não há tergiversação nem sofisma, me deixa entusiasmado! Sejamos cada um como Deus o fez para a glória d’Ele.

Que Nossa Senhora nos ajude para que possamos tirar proveito de qualquer dessas meditações, de maneira a compreendermos cada vez mais a Ela e ao Menino Jesus.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 29/12/1973)

1) Revista “Dr. Plinio”, n. 189, p. 20-25.
2) Cf. Mc 14, 36.

A Sagrada Família

Imaginando aspectos da Santa Casa de Nazaré, Dr. Plinio comenta as sublimes realidades do dia-a-dia da Sagrada Família, bem como o enlevo e a admiração do Santo Casal por seu Filho-Deus.

É comum encontrar estampas com pitorescas representações da casa onde viveu a Sagrada Família. Muitas são respeitáveis e bastante apropriadas. Em geral, combinam uma pureza diáfana com uma luz que não era apenas a de um dia belamente luminoso — luz persistentemente matinal de um horário que já não é matinal. Em síntese, apresentam uma simplicidade absoluta junto a uma limpeza absoluta.

Isto é o que nos apresentam tais figuras, mas fica-se sem saber o que dizer a respeito do que acontecia na Casa de Nazaré. Imaginemos, então.

Imaginando aspectos da casa e do dia-a-dia

O que comentar, por exemplo, da limpeza desta casa?

Era Maria Santíssima que, diante dos coros angélicos extasiados, fazia a limpeza da Santa Casa. Às vezes era São José, seu castíssimo esposo, quem a fazia. Noutra ocasião, quando estavam cansados, era o Menino quem limpava a casa para que os pais a encontrassem em bom estado… É difícil crer, mas nem sequer os Anjos tinham o privilégio de limpá-la.

Num canto da casa, há um simples jarro, do qual se levanta uma açucena, reta como a virgindade. É a única coisa que fala de arte; o resto é tão simples…

Entretanto, olhando para qualquer madeira tosca, para o pé de uma cadeira, por exemplo, ou para uma prateleira que suporta três ou quatro pequenos objetos indispensáveis para viver, fica-se extasiado! Não se sabe o que dizer diante dessas “sublimes bagatelas”, tão comuns na vida de qualquer um, mas, que por estarem postas naquela casa, assumem um caráter todo especial.

Sublimes realidades

Imaginemos São José sentado, torneando alguma coisa, enquanto Nossa Senhora faz alguma costurinha, e o Menino que, tão pequeno ainda, brinca com duas ou três pedrinhas, em pé, apoiado numa cadeira vazia.

Não há palavras que bastem para nos explicar o que, na realidade, está se passando: este Menino — verdadeiro menino, nascido da linhagem de David — foi gerado pelo Espírito Santo nas entranhas de Nossa Senhora, a flor do gênero humano!

Enquanto o Menino Jesus brinca com suas pedrinhas, e n’Ele a natureza humana se desenvolve segundo a ordenação posta por Deus, que repercussão estará havendo nas relações das Três Pessoas da Santíssima Trindade? Entretanto, tudo tão simples, tão elementar.

Enlevo e admiração pelo Filho-Deus

Pode-se imaginar o enlevo sem fim que o casal tinha por cada olhar ou movimento do Menino. Enquanto trabalhavam em alguma coisinha, Maria e José ficavam atentos ao mínimo gesto de Jesus e procuravam não perder sequer uma emissão de voz d’Ele.

Quem não ficaria atento? Afinal, eles sabiam que era o Homem-Deus que estava assim Se movendo.

Isto representava para eles um tesouro sem conta.

O dia-a-dia da Sagrada Família

Como seria o relacionamento no seio da Sagrada Família?

Conversariam sobre a virgindade fecunda de Nossa Senhora? Teriam uma interlocução por onde, constantemente, faziam referência à natureza divina? Ou somente falavam sobre estes assuntos nas grandes ocasiões, quando, por exemplo, baixavam do Céu luzes extraordinárias, ou quando contemplando o Menino tinham êxtases místicos?

Eu sou propenso a acreditar que, na maravilha desse convívio interno, as situações mais diferentes se sucediam simultaneamente, e isto constituía uma forma de convivência celeste.

A vida comum de uma pobre família operária, e o encanto das considerações metafísicas e sobrenaturais de Nossa Senhora e de São José, que viviam inundados pela presença do Menino, uniam-se no dia-a-dia da Casa de Nazaré.

Numa ocasião comum, Nossa Senhora perguntaria:

— José, meu esposo, fostes vós que abristes aquela porta? Ireis porventura sair, levando o banco que acabastes de fazer?
— Senhora, responderia São José, preciso ainda ficar aqui por algum tempo, exceto se vossa vontade for outra.

Acrescentaria ele:

— Senhora, Vós Vos distraístes — ele bem sabia que Maria tinha estado conversando com os Anjos — e o almoço vai longe em nosso pequeno fogareiro; vede um pouco… Quem sabe ao certo como se davam estas coisas? Pode-se imaginar tudo.

Previsão do sofrimento e da glória

Noutra ocasião, o Menino — que quando adulto, no Tabor, reluziria entre Moisés e Elias de um modo tão esplendoroso —, no momento inopinado em que vinha pedir licença aos pais para brincar um pouco no jardim, apareceria diante deles com um brilho deslumbrante. Eles passavam alguns instantes sem poder responder ao Menino — o qual esperava reluzente a resposta —, completamente transportados para outra esfera: estavam diante de Deus.

Em certos momentos, Eles viam que o Menino Lhes aparecia brincando com dois pauzinhos que Ele carregava às costas: era o precônio da cruz.

Ficavam, então, com o coração partido, olhando o Menino Jesus andar determinadamente de um lado para outro na casa, fazendo um gesto ao Padre Eterno. Era um ato figurativo da Agonia no Horto.

Tudo estava impregnado por uma respeitabilidade, uma majestade, de uma seriedade augusta, de uma determinação forte, para dizer tudo em uma só palavra, de uma seriedade e de uma dor desconcertantes!

Que dor, que nobreza, que grandeza, que majestade!

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 20/11/82)

Santos Inocentes

A Santa Igreja comemora, hoje, o martírio dos Santos Inocentes.

No segundo capítulo do Evangelho de São Mateus encontramos a narração das circunstâncias da fuga da Sagrada Família Fuga para o Egito. Foi um êxodo por causa da perseguição ordenada por Herodes, o Grande, que tinha como objetivo matar o Menino Jesus.

Transcrevemos um pensamento de Dr. Plinio a este respeito:

Santo Estêvão quis ser mártir e foi. São João quis ser mártir e não foi. Os bem-aventurados Inocentes — as crianças mortas por Herodes, em sua tentativa de, junto com elas, matar também o Messias que há poucos dias nascera — não quiseram ser mártires e foram. Porque elas não tinham vontade e entendimento, mas foram mártires sem querer.

A respeito, D. Guéranger escreve o seguinte:

“Mas quem duvidará da coroa obtida por estas crianças? Perguntareis: onde estão os méritos para esta coroa? A bondade de Cristo seria vencida pela crueldade de Herodes? Este rei ímpio pode mandar matar crianças inocentes, e Cristo não poderia coroar aqueles que morreram por sua causa?”

Assim sendo, temos uma legião de inocentes que estão no Céu e que rezam continuamente por nós. Compreendemos melhor de que maneira o mundo realiza o plano salvador de Deus. Quando se pensa profundamente no enorme número de crianças que morreram batizadas — sem culpa nenhuma, que vão, portanto, diretamente para o Céu —, compreende-se que são também santos inocentes.

Se tivéssemos um santo canonizado em nossas famílias, nós seríamos muito devotos dele. Ora, certamente, na família de todos existem como que santos canonizados. Isto porque nas famílias de todos, ou de quase todos — se não entre os irmãos, pelo menos entre primos ou parentes mais afastados —, existem crianças que morreram batizadas. Logo, estão no Céu, onde elas têm toda a lucidez de uma alma que está convivendo com Deus face-a-face. Podemos então rezar, recomendando-nos às orações delas, que são padroeiras naturais da família.

(Plinio Corrêa de Oliveira – extrato da conferência de 28/12/1965)

 

Sentinela, mesmo após a morte

São Tomás Becket, assassinado por defender os direitos eclesiásticos contra os abusos do poder temporal na Idade Média, foi mártir da liberdade da Igreja.

Homenageado pelos ingleses durante quatro séculos, teve seus restos mortais profanados e destruídos por ordem do Rei Henrique VIII que, ao proclamar-se chefe da igreja anglicana, deliberou injuriar as relíquias daquele que morrera para que tal usurpação não se desse.

Nessa execução póstuma há uma verdadeira glória para São Tomás Becket: ser odiado pelos maus e sofrer perseguição por amor a Nosso Senhor Jesus Cristo.

Este Santo, até depois de morto, constituía uma barreira para os inimigos da Igreja. Foi preciso remover esse obstáculo para que a caudal da heresia pudesse continuar. Ora, um homem que, deitado inerte no seu jazigo, representa ainda uma sentinela pela qual só se passa eliminando-a, é uma verdadeira beleza!

Santa Teresinha do Menino Jesus dizia que ela passaria seu Céu fazendo bem sobre a Terra. São Tomás Becket, à maneira dele, fez isto: quatrocentos anos após seu martírio, seu corpo era uma trincheira e um pavor para os adversários.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 28/12/1968)

GLÓRIA A DEUS NO CÉU, E PAZ NA TERRA AOS HOMENS DE BOA VONTADE

As reflexões sobre o Natal es-critas em 1936 por Dr. Plinio parecem feitas, de algum modo, mais para os dias de hoje do que para aquela época, tanto no tocante às nuvens negras que toldam o quadro dos acontecimentos, quanto aos raios de esperança que o perpassam.

Enquanto os Anjos de nossos piedosos presépios ostentam dísticos em que se lê: “Glória a Deus nos Céus, e paz na terra aos homens de boa vontade”, a imprensa diária está cheia de notícias  terríveis que destoam tristemente da promessa angélica. […] Por toda parte só encontramos ódio, rancor, perseguição.

E, no entanto, cumpre que não desanimemos. Não seríamos dignos da graça inestimável do Batismo que recebemos, se permitíssemos que o pânico se apoderasse de nós. Nem na ordem natural, nem na ordem sobrenatural, há motivos que justifiquem a inércia e o pessimismo.

Cristo, como único Salvador do mundo: lição do Natal

O que a Igreja espera, hoje em dia, de seus filhos, é a realização de uma tarefa ao mesmo tempo muito grande e muito simples. Ela quer que todos os católicos (os católicos dignos deste nome, e  não a turbamulta dos pagãos que usam rótulo católico), com uma persuasão vigorosa e magnífica, se ergam no tumulto do mundo contemporâneo, proclamando o cristianismo como seu único Salvador.

Único, dissemos. E insistimos sobre esta palavra. Erraria crassamente quem supusesse que o Cristo só veio salvar a humanidade de seu tempo. Em todos os tempos, em todos os países, para todos os povos, em todos os perigos, em todas as dificuldades, apesar de todos os pecados, Cristo é o ÚNICO Salvador.

[Alguns países] pensam que podem atingir a prosperidade e a paz, por meio de pequenas receitas políticas em que misturam, em doses variáveis, a autoridade e a liberdade. Loucura e ilusão. Se  eles não aceitarem as normas sociais e morais da Igreja, se não derem ao catolicismo a influência preponderante a que tem direito, não escaparão à ruína. De reforma em reforma, rolarão para o abismo.

[Outros países] pensam que o braço vigoroso de um ditador lhes pode restituir a felicidade. Loucura, ainda, e ilusão. Porque o maior homem do mundo, dotado da mais lúcida inteligência, da mais alta moralidade, da mais vigorosa energia, do mais formidável poder, não conseguiria organizar convenientemente um povo que vivesse entregue à anarquia intelectual e efetiva que, fora da Igreja, é inevitável. Um povo é um conjunto de homens. Um povo disciplinado não pode ser composto de homens anarquizados no mais íntimo do seu ser, como um copo de água pura não pode constar de um conjunto de gotas de água impuras.

Cristo como base da civilização, e as formas do governo como aspectos secundários e acidentais da vida de um povo, eis aí uma das grandes lições do Natal.

Trabalhar, lutar, sofrer e rezar pela Igreja

Mas, dirá alguém, Cristo é um Salvador ausente. Eternamente mudo, atrás da cortina de nuvens que o escondem no Céu. Ele não se mostra à humanidade aflita. E esta então corre à busca de outros pastores.

É horrível dizê-lo, mas há entre católicos quem fale assim. Há ainda quem não ouse falar, mas pense assim. E há quem não ouse pensar, mas sinta assim! Daí o existirem católicos que têm mais  esperança na ação da política do que na ação do Cristo.

Ah! São esses os corações que recebem a visita eucarística do Cristo, mas não recebem o seu Espírito: “in propria venit, et sui eum non receperunt” (veio para que era seu, e os seus não o receberam).

Ah! São esses os corações que ouvem a palavra do Cristo, vinda do Vaticano, e não conhecem na voz do Papa o timbre da voz de Deus. A palavra do Papa ecoa no mundo, e o mundo não a conhece:  “lux in tenebris lucet, et tenebrae eam non conprehenderunt” (a luz brilha nas trevas, e as trevas não a envolveram).

Cristo, para o bom católico, não está ausente. Na Eucaristia, Ele está tão realmente quanto esteve na Judeia. E do Vaticano fala tão verdadeiramente quanto falou ao povo de Israel. A Igreja é tão  seguramente guiada por Cristo em 1936, quanto o eram os Apóstolos, antes da Ascensão.

O que Cristo quer fazer, fá-lo por meio da Igreja. O que Cristo quer dizer, di-lo por meio do Papa. Logo, a Igreja em certo sentido é onipotente e onisciente porque é instrumento da onipotência e porta-voz da onisciência de Deus.

Se Cristo é o Salvador único, a Salvação virá da Igreja. Trabalhar, lutar, sofrer, rezar, imolar-se ou sacrificar-se alegremente pela Igreja, deve ser o fruto desta meditação de Natal. Porque todas as  causas e todos os ideais devem vir depois da suprema Causa e do supremo ideal da Igreja.

GLÓRIA A DEUS NAS ALTURAS, E PAZ NA TERRA AOS HOMENS DE BOA VONTADE.

Plinio Corrêa de Oliveira (Excertos, com ligeiras adaptações, de artigo do Legionário nº 224, de 27/12/1936. Subtítulos nossos.) 
Revista Dr Plinio 57 – Dezembro de 2002

 

Precursor na luta contra a heresia

São João Evangelista foi um dos primeiros lutadores contra a heresia, que nascia em seu tempo, a respeito das relações entre as naturezas humana e divina de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Então, o Apóstolo virgem, o Apóstolo do Coração de Jesus, o Apóstolo que recebeu Nossa Senhora como Mãe, foi também o precursor de todos os lutadores da Fé até o fim do mundo.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 27/12/1964)

São João Evangelista

Era uma alma eminentemente virgem, chegada de modo extremo a Nosso Senhor, devotíssima do seu Coração Sagrado.

São João Evangelista, mais que Apóstolo, foi verdadeiro amigo do HomemDeus. Por isso, Nosso Senhor, antes de expirar no madeiro, deixou ao seu discípulo predileto um tesouro inapreciável: Maria Santíssima.

Receber Nossa Senhora, é receber  tudo o que Deus depois de dar-se a Si mesmo pode conceder ao homem. Maria, Virgem, foi dada pelo virginal Filho ao virginal amigo que era São João. Nessa  entrega vemos uma manifestação extraordinária do amor de Deus às almas virgens. E vemos, também, um dos rutilantes traços da grandeza do Apóstolo Evangelista.

Plinio Corrêa de Oliveira

São João Evangelista

Como diz muito bem o Abade Dom Guéranger, “São João Evangelista era parente de Nosso Senhor segundo a carne, e enquanto outros foram Apóstolos e discípulos, ele foi amigo do Filho de Deus”, a quem Jesus tributava um sentimento mais próximo e íntimo que aos demais.

Na última Ceia, São João reclinou-se sobre o peito do Mestre e ouviu as pulsações do Sagrado Coração: naquele instante, pulsações de amor, mas também de dor e angústia, diante dos abismos de sofrimentos que d’Ele se acercavam.

Alma eminentemente virgem e unida a Nosso Senhor, predileta e devota do Sagrado Coração de Jesus, São João mereceu como recompensa um tesouro sem preço: aos pés da Cruz, recebeu por Mãe a própria Mãe do Redentor, Maria Santíssima. Mais do que isto, abaixo d’Ele, Deus não lhe poderia dar…

São João Evangelista

São João Evangelista, discípulo amado do Divino Mestre, devemos pedir que nos alcance uma piedade semelhante à dele, toda imbuída de confiança e de intimidade em relação a Nosso Senhor Jesus Cristo e Nossa Senhora; que nos obtenha, portanto, uma devoção à Santíssima Virgem e um amor a Deus como ele os manifestou, marcados ao mesmo tempo por suprema veneração e por filial ternura.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 27/12/1966)