Santo Elói Ourives, ecônomo e apóstolo perfeito

Perpetuado numa canção popular francesa, a figura do “grande Santo Elói” resplandece em sua época, unindo o extraordinário talento artístico ao discernimento ímpar de diplomata e, sobretudo, à excelência de suas virtudes. Dr. Plinio nos evoca as principais facetas da vida deste modelo de apóstolo, artesão e político.

Santo Elói distinguiu-se no seu tempo pelas qualidades sui generis que o caracterizaram, tendo sido sua vida semeada de fatos interessantíssimos dos quais nos dá conhecimento uma biografia escrita pelo Pe. Rohrbacher. Desta, algumas passagens merecem ser aqui comentadas.

Hábil ourives e diretor das finanças do reino

Escreve o ilustre hagiógrafo:
“Santo Elói foi dotado de invulgar personalidade. Viveu de 588 a 659. Natural de Limoges [França], revelou desde criança grande aptidão para os trabalhos manuais. Encaminhado para a profissão de ourives, tornou-se um dos mais hábeis artistas de seu tempo. Famoso é o caso da confecção do trono do Rei Clotário, que o queria ímpar e incrustado de pedrarias. Com o ouro recebido para tal fim, Elói fez não um, mas dois tronos igualmente preciosos.”

A ideia de um santo confeccionar um trono para um monarca, contribuindo com sua arte para a pompa real, talvez contrarie não poucos espíritos modernos, adeptos de uma simplicidade equivocada. Mais ainda os chocariam a iniciativa de Santo Elói de fazer algo aparentemente inútil: dois tronos em vez de um só…

“O rei então o nomeou seu ourives e diretor da Moeda.”

ais cargos tendiam a ser conexos naquele tempo, porque as moedas eram de ouro e quem exercia a função de ourives do rei poderia igualmente ser escolhido para dirigir a economia.

Como se vê, não era fácil a existência de alguns personagens daquela época.

Grande político e diplomata

“Sucedendo a Clotário seu filho Dagoberto, Santo Elói tornou-se grande amigo do soberano, revelando-se então insigne conselheiro, hábil político e diplomata.”

Vemos assim a ascensão de Santo Elói: de ourives passou a diretor da Moeda e, em seguida, diplomata.

“Afirma-se que os enviados de príncipes estrangeiros avistavam-se primeiro com ele, antes de se dirigirem ao monarca. Sua influência junto a Dagoberto era suficientemente grande para que o santo pudesse repreendê-lo contra sua moral, bastante relapsa, e também quanto ao seu modo desmazelado de trajar-se.”

Esta circunstância da vida de Santo Elói deu origem à conhecida canção popular francesa “Le bon Roi Dagobert” (ver quadro). Percebe-se, entretanto, que o bom Rei Dagoberto não era tão louvável assim, merecendo algumas censuras. Mas, possuía esta qualidade: simpatizava-se com Santo Elói, apreciava-o e devotava-lhe grande amizade. Mais ainda. Quando o santo conselheiro lhe chamava a atenção, o rei acatava a reprimenda com submissão e alegria.

Muito interessante o fato de Santo Elói corrigir o Rei quanto ao desmazelo de seus trajes, querendo assim que ele se vestisse com distinção e bom-gosto. Essa atitude do homem de Deus pode chocar certos espíritos contemporâneos, notadamente aqueles que chamaríamos de “heresia branca”. Pois, segundo esta, um rei deve usar roupas comuns e baratas, e desejar desfazer-se das galas e preeminências que cercam seu cargo.

Artífice de relicários e fundador de mosteiros

Continua a biografia:
“O tempo que lhe sobrava de seu trabalho na corte, de suas orações e obras de caridade, empregava-o em honrar com sua arte as relíquias dos santos.”

Hoje em dia vemos muitas pessoas aplicarem seu tempo livre em ninharias. O passatempo de Santo Elói era fazer relicários!

Imaginemos uma sala de estilo românico, pressagiando o gótico, cujas porta e janela dão para um pátio. A tarde começa a se confundir com o anoitecer. Nosso Santo, terminado seus afazeres, senta-se junto a uma mesa de ourives no palácio real, acende as velas de alguns candelabros, e continua a trabalhar nos lavores e polimentos de um bonito relicário, ornado de pedras preciosas, no qual ele guardará os restos de um bem-aventurado de sua devoção. Nessa tarefa, emprega ele toda a sua piedade e todo o seu talento artístico! É uma cena maravilhosa.

E se pensarmos que, na linguagem atual, Santo Elói era o Ministro da Fazenda daquele rei, que diferença em relação a certos estadistas contemporâneos!

“Atribuem-se-lhe os relicários de São Germano de Paris, São Denis, São Severino, São Martinho, Santa Colomba e Santa Genoveva. Além desses trabalhos, Santo Elói fundou numerosos mosteiros.”

Cumpre assinalar o extraordinário vigor de Santo Elói e sua intensa atividade. Afinal, era diplomata, político, ecônomo, ourives, artífice de relicários e ainda encontrava tempo e meios de fundar mosteiros! Foi um desses homens dos quais emanam mil obras, todas repletas de pensamento e santidade.

Zelo, sabedoria e bondade

“Tendo sido ordenado sacerdote, foi sagrado Bispo, ocupando a Sé episcopal de Noyon. Como muitos outros prelados da época merovíngia, foi um grande organizador, um apóstolo repleto de zelo, sabedoria e bondade.”

As fecundas ações deste homem de Deus evocam as de São Martinho de Tours, comentadas por nós em oportunidade anterior. Quer dizer, nas épocas de estruturação e organização da Cristandade medieval, a Providência suscitou vários santos que empreenderam inúmeras obras admiráveis. Um deles foi Santo Elói.

“Sua atividade irradiou-se para Flandres, Holanda e, segundo afirmam, Suécia e Dinamarca.”

Isso significa uma alta e árdua missão, pois naquele tempo a Suécia e a Dinamarca eram ainda habitadas por povos bárbaros. E até lá propagou-se o zelo apostólico do grande Santo Elói.

Velado por uma santa

Após essa vida de intenso serviço a Deus e ao próximo, ele receberia afinal o prêmio por suas virtudes. E o Pe. Rohrbacher registra esse tocante fato:
“Era grande sua fama, a tal ponto que, sabendo-o agonizante, a Rainha Santa Batilde fez longa viagem para vê-lo antes de morrer. Mas chegou a Noyon no dia seguinte ao de seu falecimento.”

Portanto, a magnífica existência de Santo Elói se encerra e logo se verifica esta bela cena: a Rainha Batilde, santa ela mesma, tendo notícia de que o Bispo de Noyon se achava à beira da morte, desloca-se por estradas difíceis, correndo riscos, protegida por um grande séquito, rezando para encontrar Santo Elói ainda vivo. Naturalmente, desejava receber algum conselho dele. Porém, alcança Noyon quando aquele já entregara sua alma a Deus.

Podemos imaginar a chegada de Santa Batilde à cidade, o cortejo de autoridades e de pessoas do povo que vão recebê-la e lhe transmitem a notícia da morte de Santo Elói. A Rainha se dirige imediatamente para junto do esquife, venera os restos mortais e eleva suas preces — por ele e a ele. É uma santa ao lado do cadáver de outro santo!

Eis um maravilhoso epílogo para uma vida pontilhada de episódios também maravilhosos, numa época repleta de maravilhoso.

Plinio Corrêa de Oliveira