Tesouro da verdadeira Igreja

Célebre por sua imponente beleza e extraordinário significado para a piedade católica, a Basílica de Santo Antônio de Pádua reluz como precioso tesouro da arquitetura engendrada pela Igreja.

Ao considerá-la, vem-me ao espírito, uma vez mais, a comparação com o perpétuo objeto de meu enlevo, de meu encanto e entusiasmo: o mar. Nele, como já tive ocasião de dizer, sempre me agradou contemplar as inúmeras formas de pulcritude com que Deus o criou, os diversos estados em que ele se apresenta a nós, desde a extrema calma até  a extrema agitação, com todas as gamas intermediárias. Ora é o ordenado das grandes ondas que avançam em ofensiva para a terra, sem tumulto nem descabelo, como um  ataque em regra de uma cavalaria nobre. Por vezes as ondas nem sequer arrebentam, apenas se avolumam e se estendem; outras, pelo contrário, estouram na praia ou nos  rochedos, e há um gáudio de gotas pelo ar, bailando alegremente, como se executassem uma lendária dança da vitória. Ora me compraz ver o mar inteiramente calmo, quase  imóvel.

Dir-se-ia que ele se encontra de tal maneira absorto na contemplação do céu, para o qual olha a todo momento, que nem pensa em si mesmo… De repente, a partir de um  ponto qualquer daquela imensidão líquida, algo começa a se mover. Dali a pouco é um vagalhão, é um tumulto aquático, e é outro assalto contra a terra. Dessa vez, porém, as  ondas não se aproximam em fileiras ordenadas, mas parecem vir se empurrando e se acotovelando, cada qual no desejo de tomar a dianteira e conquistar a terra mais  depressa. É a beleza da variedade, do inesperado, do quase susto, do imprevisto, que tem seu encanto próprio. E é essa sucessão de aspectos que torna o mar tão entretido.

Ora, a arquitetura, e especialmente a arquitetura religiosa, pode ter uma variedade de feitios análoga aos movimentos do mar. Será, por exemplo, a calma e a estabilidade de  uma Catedral de Notre-Dame de Paris: irrepreensível, ordenada, perfeita, lindíssima, cheia de lógica, de poesia e candura.

Outras vezes, a arquitetura borbulha e apresenta aspectos meio inesperadas. E é o próprio movimento da alma religiosa, nos seus entusiasmos, nos seus êxtases, nos seus  impulsos, na sua generosidade, nos lances ‘a la’ Santa Teresa de Jesus, ‘a la’ Santo Inácio de Loyola, que nos deixam desconcertados diante de sua grandeza. E isso é o que se  nota no jogo das várias cúpulas e minaretes da Basílica de Santa Antônio de Pádua, borbulhantes como o movediço das ondas do mar.

Olhando-se para o teto da igreja quase se esquece do corpo do edifício. Tem-se a impressão de que todo o resto existe como uma bandeja para carregar bem alto o  movimento musical das coberturas. E assim como podemos imaginar uma melodia num “crescendo” em que as notas se vão sucedendo alegremente umas às outras, assim nos parece que esses minaretes e cúpulas estão jubilosos à espera da hora em que sejam separados da base para poderem subir em direção ao céu. E que essa ansiedade do maravilhoso, uma ansiedade festiva, feliz, é apenas contida por uma corda que mão caridosa a qualquer instante vai cortar.

Noutra analogia com o mar, do mesmo modo como este é também rico e esplendoroso nos mistérios de suas profundezas, igualmente o interior da Basílica de Pádua é um imenso escrínio de tesouros espirituais e artísticos. É, sobretudo, o ambiente criado pela presença do Santíssimo Sacramento, pelas relíquias do grande Santo franciscano, pelas graças de que elas são veículo e que impregnam todo o recinto da igreja, estimulando e condicionando a piedade dos fiéis que ali rezam e se recolhem com edificante  devoção.

Além disso, a profusão de maravilhas que ali deixou a arte cristã, entre abóbadas, colunas e capitéis esplendidamente trabalhados; capelas, altares e murais em que se pode admirar o talento de mestres imortais, e um grande número de pinturas e imagens que datam de diferentes épocas da Cristandade, fazem com que a Basílica pareça um compêndio da história da piedade católica.

Todos esses fatores — beleza arquitetônica, presença do Coração Eucarístico de Jesus, relíquias de Santo Antônio de Pádua, imagens especialmente abençoadas, fiéis que recebem graças e as deixam transpirar de algum modo na sua maneira de ser, de andar e de rezar — concorrem, numa igreja como a Basílica de Pádua, com particular intensidade para conferir uma impressão única de piedade autêntica, e uma sensação de presença verdadeira da verdadeira Igreja, a Esposa Mística de nosso Divino Redentor.

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