Majestade com tranquilidade, força com bondade

Possuindo em altíssimo grau a virtude da combatividade, Dr. Plinio tinha grande admiração por Carlos Magno, varão católico que levou o combate desde o Reno até Santiago de Compostela, e desde o norte das florestas alemãs até o centro do poder árabe na Espanha.

 

Analisemos segundo a regra do ver, julgar e agir, de São Tomás de Aquino, o relicário de Carlos Magno, que se encontra na Catedral de Aachen.

Firmamento de equilíbrio e de bom gosto

O objeto é constituído de duas partes: uma caixa e uma tampa. A caixa é quadrangular, comum. Mas sobre uma forma tão simples — uma caixa com tampa — está colocado um mundo, um verdadeiro firmamento de equilíbrio e de bom gosto.

Em primeiro lugar, vejamos de que espécie de metal é feito. Não é propriamente ouro. Creio que eles nem tinham ouro suficiente para fazer uma caixa como esta. Mas é uma espécie de bronze dourado que tende a imitar o ouro, e talvez entre um tanto de ouro nessa liga.

É uma caixa que dá a ideia de ser forte; tem-se a impressão de se tratar de um cofre que não se arromba com facilidade, o qual guarda um tesouro. A urna manifesta, de algum modo, a grandeza do tesouro que ela encerra em si. Quer dizer, ela exprime, de certa maneira, a grande alma de Carlos Magno. Em que sentido?

A vida dele foi de equilíbrio, de ação reta e de uma constância admirável. Notem a bonita proporção existente entre a altura da caixa e a da tampa. Se a tampa tivesse três vezes a altura da caixa, por exemplo, o objeto estaria estragado. Caso ela fosse um pouco mais baixa do que é, ficaria achatado. Tem o tamanho necessário para uma obra de equilíbrio que representa o equilíbrio do grande Carlos.

Modelo para a formação de nossas almas

Para adornar a caixa, ela tem externamente essas colunas e esses arcos, próprios à parede de uma capela. Cada Santo está colocado em um trono no interior de uma espécie de capelinha.  Porque convém a cada Santo ter seu altar e seu culto. Mas convém também a cada rei ter um reino com sua corte. E esses são reis que ficaram santos exercendo a função e a vocação de rei; a realeza e a santidade estão apresentadas juntas no caixão daquele que foi um rei-modelo, e esperamos que um dia a Igreja o declare um verdadeiro Santo.

Há uma coisa curiosa que talvez alguns não notem à primeira vista: nenhum deles está gesticulando, falando, nem nada disso.  Se ficassem “gesticulando” e “falando” dava a impressão de uma feira. Entretanto, na posição em que eles todos estão, tem-se a impressão de que cada um possui a sua individualidade, tem seu papel, mas não procura abafar os outros, não procura dominar. É o convívio perfeito dos reis na Cristandade, convívio perfeito dos Santos no Céu.

A meu ver, é esta a impressão causada, e é muito bonito que seja assim.

É interessante o papel das pedras preciosas. Há um formoso trabalho de ourivesaria aí, cheio de pedras preciosas de cá, de lá e acolá. Contudo, tem todas as pedras que convém, na medida e proporção exatas, tudo bonito, bem arranjado.

Quem contempla esta urna encontra nela um misto de calma, majestade com tranquilidade, e força com bondade. Aí está retratado o grande Carlos.

Esse relicário é uma obra de equilíbrio, bom gosto e santidade.

Bem, isso já é julgar. Portanto, nós vimos e julgamos. Agora, resta-nos agir.

Devemos perguntar se em face disso tomamos a atitude interior que devemos tomar. Quer dizer, se damos a esse objeto a importância que precisamos dar, pois ele é um modelo para a formação de nossas almas.

Por exemplo, se eu tivesse muitas fotografias dessas, colocaria à disposição de qualquer um que pedisse para ter, por exemplo, no respectivo aposento, porque é uma coisa que faz bem olhar antes de dormir.

Se não no quarto de dormir, no lugar onde trabalha ter um quadro sobre a mesa. É bonito, agradável e faz-nos sentir ao mesmo tempo pequenos — porque isso é grandioso —, mas também filhos. Não há aí nenhum desprezo por nós. Há um convite como quem diz: “Chegue perto e admire. Seja filho disso, ame isso, na harmonia que deve haver entre todas as coisas. Essa atmosfera é sua.”

A pedra em “cabochon” e a lapidada

Vemos em outra fotografia o famoso busto de Carlos Magno.

Prestem bem atenção nesta fisionomia esculpida por alguém que estava muito menos distante dele no tempo. Observem como é doce, natural. Não tem nada de orgulhoso. É o homem que levou o combate dele desde o Reno até Santiago de Compostela, e desde o norte das florestas alemãs até o centro do poder árabe na Espanha. Uma coisa formidável! Mas vejam a naturalidade, a bondade, a nobreza, ao mesmo tempo. Que grande pessoa!

Notem que, além das pérolas, há várias pedras preciosas, todas elas lapidadas à maneira do que em francês se diz “en cabochon”.

Qual a diferença do “cabochon” para o outro modo de lapidar? Na pedra lapidada, corrente hoje, corta-se a pedra em várias superfícies para fazer ângulos. E os ângulos aumentam o brilho da pedra quando uma pessoa, uma senhora, por exemplo, está com um anel e gesticula.

Aqui não. Eles não sabiam lapidar; simplesmente arredondavam o contorno da pedra. Mas tinha isto de bonito: de longe brilhava menos, mas guardava mais luz dentro de si. Essas pedras são pequenos reservatórios de luz.

É supérfluo dizer que eu gosto muito mais da lapidação “en cabochon” do que da lapidação moderna.

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 22/11/1988)

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